A princípio, é possível experimentar muita falta de ar, arritmia, tontura, dor de cabeça muito forte e náuseas, depois podem ocorrer as convulsões, o coração começa a bater mais devagar, a pressão arterial baixa e a mente se torna anuviada com a perda de consciência, tudo para que finalmente o coração pare de bater. Se ainda assim a pessoa sobreviver, os danos neurológicos surgem ao longo do tempo e podem ser irreversíveis.
O envenenamento por cianeto foi o protagonista no século XVIII nas mãos de centenas de assassinos em série. A toxina era popular na época pelo fácil acesso, já que era o componente químico de tintas, papéis de parede e outros produtos. Além disso, uma morte por cianeto era muito discreta e poderia parecer tudo, menos um crime.
Cápsula letal
Às 6h30 de 29 de setembro de 1982, uma garota de 12 anos chamada Mary Kellerman, moradora do bairro suburbano de Elk Grove Village, em Chicago, Estados Unidos, reclamou para sua mãe sobre a garganta estar doendo e o nariz não parar de escorrer. A mãe lhe deu uma cápsula de Tylenol, o popular paracetamol que tem ação analgésica e antitérmica e que pode ser comprado em qualquer farmácia sem prescrição médica. Às 7h, Kellerman foi encontrada morta em sua cama.
A cerca de 19 quilômetros dali, naquele mesmo dia, Adam Janus, um funcionário dos correios de 27 anos que morava em Arlington Heights (Illinois, Chicago) morreu de um ataque cardíaco fulminante. Sofrendo com o luto, seu irmão e sua cunhada, Stanley (25) e Theresa (19) foram acometidos por fortes dores de cabeça, portanto resolveram tomar uma cápsula de Tylenol. Mais tarde, naquele dia, Stanley morreu em circunstâncias similares a de seu irmão, enquanto Theresa veio a óbito 2 dias depois.
Em um período de 3 dias, na mesma região de Chicago, 7 pessoas morreram após ingerirem uma pílula de Tylenol. Uma investigação intensa descobriu que o medicamento que estava exposto nas prateleiras de várias farmácias, mercados e postos de conveniência foi misturado a quantidades fatais de cianeto de potássio.
A crise
Os investigadores concluíram que se tratava de uma sabotagem das embalagens do medicamento. Provavelmente, a pessoa teria adquirido vários frascos de Tylenol em pontos de venda diferentes em Chicago durante algumas semanas e adicionado o cianeto às cápsulas com uma seringa, visto que o involucro era gelatinoso. Então, teria retornado sistematicamente às lojas e devolvido as embalagens às prateleiras.
A polícia conseguiu descobrir algumas embalagens contaminadas com cianeto à venda em uma das lojas da cadeia de supermercado Dominick’s, perto da rede de farmácias Walgreens, que foi onde a comissária de bordo Paula Prince, da United Airlines, comprou uma caixa de Tylenol. Ela foi encontrada morta em seu apartamento 2 dias depois.
A McNeil Consumer Products, subsidiária da Johnson & Johnson e fabricante do medicamento nos Estados Unidos, rapidamente emitiu comunicados em rede nacional advertindo os cidadãos sobre o crime que estava sendo investigado. Eles instruíram as pessoas a pararem de comprar o Tylenol em qualquer ponto de venda e pediram para que aqueles que tivessem adquirido o produto o devolvessem em qualquer loja para substituir por outro medicamento. A empresa também ordenou um recall massivo de mais de 31 milhões de frascos de Tylenol que estavam em circulação por Chicago.
A McNeil ofereceu uma recompensa para qualquer pessoa que tivesse informações que pudessem levar ao paradeiro do responsável pelos assassinatos.
Os copycats
Um homem chamado James Lewis enviou uma carta à Johnson & Johnson alegando que era o “assassino do Tylenol” e exigindo US$ 1 milhão para impedir que mais pessoas morressem. Por meio das impressões digitais deixadas no envelope, a polícia o identificou e não encontrou nenhuma relação sua com os crimes, visto que ele morava em Nova York. William foi condenado por extorsão e cumpriu 13 anos de prisão de uma sentença de 20 anos.
No entanto, anos mais tarde, o canal WCB Channel 5, de uma emissora em Boston, alegou que o Federal Bureau of Investigation (FBI) estava em posse de documentos em que investigadores do Departamento de Justiça confirmavam que Lewis era o responsável pelos crimes, apesar da falta de provas. Até janeiro de 2010, Lewis continuava a afirmar que não tinha qualquer relação com os envenenamentos e que enviou aquela carta para se aproveitar da situação.
Na mesma época, os investigadores apontaram Laurie Dann como suspeita. A mulher havia envenenado várias pessoas e atirado na população em um tumulto que aconteceu em maio de 1988, próximo de Winnetka, em Illinois. Contudo, não encontraram nenhuma conexão dela com os crimes.
A repercussão do caso gerou centenas de ataques copycats (crimes inspirados em outros) em vários medicamentos de venda livre. Em 1986, mais 3 pessoas foram vítimas de cápsulas de Tylenol adulteradas em Nova York. Em Washington, cápsulas envenenadas de Excedrin (medicamento indicado para dores de cabeça) causaram a morte de Susan Snow e Bruce Nickell.
Gerindo uma crise
Antes dos envenenamentos, o Tylenol era responsável por 35% do mercado de analgésicos de venda livre, mas em menos de 6 semanas após as mortes o número caiu para 8%. A Johnson & Johnson agiu rapidamente e começou um processo de desenvolvimento de novos métodos de proteção, tanto do Tylenol quanto de outros medicamentos que apresentavam vulnerabilidade em suas embalagens.
Em 1983, a gigantesca empresa introduziu proteções de alumínio na boca dos frascos de Tylenol, tornando-os à prova de violações. O método foi tão eficaz que o Food and Drug Administration (FDA) dos Estados Unidos o adotou como meio de segurança padrão na indústria de medicamentos de venda livre do país inteiro.
No mesmo ano, o Congresso dos Estados Unidos aprovou a lei “Projeto Tylenol”, que decretou como crime federal adulterar produtos de consumo, e o FDA estabeleceu diretrizes em fases de produção de vários itens para que fossem à prova de falsificação.
Com um investimento de mais de US$ 100 milhões e após 1 ano da implementação do novo método, o Tylenol voltou a dominar o mercado e recuperou o título de “queridinho da nação”. A Johnson & Johnson se tornou referência no mercado de negócios e departamento de marketing a respeito de como lidar com uma crise de maneira eficaz e responsável. Por outro lado, o FBI nunca encontrou o responsável pelos crimes.
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