Teste apontou estresse menor quando havia sensação de invisibilidade.
Experimento contou com a participação de mais de 100 pessoas.
Multidão atravessa faixa em meio à Avenida Paulista. Sensação de
invisibilidade por reduzir estresse em algumas pessoas (Foto: Mariana
Topfstedt/Sigmapress/Estadão Conteúdo)
A sensação de ser invisível pode contribuir para diminuir o estresse
que algumas pessoas sentem em frente às outras - foi o que descobriu um
grupo de pesquisadores, segundo os quais essa ilusão pode ajudar no
tratamento da ansiedade social.
Ser invisível é uma aspiração antiga. O filósofo grego Platão narra a
história de Giges, que se torna rei graças a um anel que lhe confere
invisibilidade. O romance de ficção científica de HG Wells, "O Homem
Invisível", atribui essa faculdade a um cientista louco, e Harry Potter,
o aprendiz de feiticeiro de J.K. Rowling, tem uma capa com esse poder.
Nos últimos anos, alguns progressos foram alcançados graças à pesquisa
com metamateriais capazes de manipular as ondas com "camadas de
invisibilidade", formadas por materiais artificiais que permitem desviar
os raios de luz que chegam em um objeto, tornando-o invisível.
"Embora os dispositivos capazes de esconder completamente um corpo
humano ainda não tenham sido desenvolvidos, não é irreal pensar que um
dia vai ser possível, e é melhor ir se preparando", explicou Arvid
Guterstam, coautor de um estudo publicado na última semana periódico
"Scientific Reports", da conceituada revista científica "Nature".
"Queremos estudar as consequências psicológicas de tal invisibilidade
para que estes dispositivos possam ser usados com segurança",
acrescentou o pesquisador em neurociência do Instituto Karolinska, em
Estocolmo (Suécia).
O estudo utilizou um total de 125 participantes, com 25 voluntários
para cada experiência. Cada um deles foi equipado com um capacete de
vídeo ao vivo e em 3D, alimentado por um par de câmeras colocadas ao
nível dos olhos. Apontando para baixo, as câmeras filmavam o vazio. Em
seguida, os pesquisadores pediram aos voluntários que se levantassem e
olhassem para baixo. Em vez de ver seu próprio corpo, as pessoas viam um
espaço vazio.
O bem e o mal
Para aumentar a ilusão, um pesquisador toca diferentes partes do corpo do participante com um grande pincel apoiado com uma mão, enquanto a outra faz um movimento no vazio. Num intervalo de 30 segundos, a maioria dos participantes teve a sensação de que seu corpo havia se tornado invisível.
"Para verificar se a ilusão funcionou, demos uma facada no corpo
invisível enquanto medimos a tensão gerada pelo gesto", contou Arvid
Guterstam. "As pessoas transpiraram mais, o que sugere que o cérebro da
pessoa percebeu este gesto no vazio como uma ameaça direta contra seu
próprio corpo", acrescenta.
Em um dos experimentos, os pesquisadores expuseram os participantes a
uma situação social estressante na presença de uma plateia de
desconhecidos.
Os cientistas constataram que a frequência cardíaca dos participantes e
seu nível de estresse declarado foi menor quando a pessoa tinha a
sensação de ser invisível do que quando ela se percebia visível pelos
demais.
"Se o cérebro percebe o corpo como invisível, supõe que o mesmo também é
verdadeiro para outros observadores, o que reduz o estresse relacionado
a ser o centro das atenções", explicou Guterstam.
A ansiedade social pode aparecer em diferentes graus ao longo da vida
em cerca de dez por cento das pessoas, de acordo com o pesquisador.
A psicoterapia cognitiva e comportamental (CBT, por sua sigla em
inglês) é o tratamento não-medicamentoso mais comum para tratar esta
fobia social. O trabalho consiste em acostumar o paciente a situações
cada vez mais estressantes.
Algumas destas terapias utilizam simulações de realidade virtual.
"Acreditamos que dar a ilusão de ser invisível poderia ser usado como um
primeiro passo para essas terapias baseadas em realidade virtual",
conta Guterstam. "Isso poderia ajudar pacientes cuja ansiedade vem de
emoções negativas relacionadas a seu próprio corpo".
Henrik Ehrsson, do Instituto Karolinska, recomenda o desenvolvimento de
novos estudos para verificar se os dispositivos futuros de
invisibilidade "não nos fazem perder nosso senso de certo e errado".
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