A temperatura no planeta pode estabilizar nos valores de há
três milhões a cinco milhões de anos, caso a humanidade consiga estancar
as emissões de gases com efeito de estufa até 2030, diz a especialista
Fátima Abrantes.
“Será o menos mal”, acrescentou a investigadora, especialista em
oceanografia geológica e paleoceanografia, autora de artigos científicos
e uma das profissionais do Instituto Português do Mar e da Atmosfera
(IPMA).
Fátima Abrantes falava à Lusa no âmbito de um seminário que o IPMA
organizou hoje em Lisboa sobre “Alterações Climáticas e recursos
marinhos: passado, presente e futuro”.
Falando sobre “fenómenos extremos no passado”, Fátima Abrantes
socorreu-se durante a intervenção no seminário de dados científicos para
explicar que alterações climáticas já aconteceram no passado e que os
oceanos sofreram grandes transformações, com zonas de muito peixe a
ficarem despovoadas e vice-versa.
Mas a especialista explicou que não estava a negar ou desvalorizar o atual processo de alterações climáticas, que, disse, está a acontecer de forma mais intensa e mais rápida do que noutros momentos, devido à ação do Homem sobre o planeta.
“O que está estável há 15 milhões de anos na Antártida e há 2,6
milhões no Ártico está a tornar-se instável de uma maneira muito rápida.
A questão não é que nunca aconteceu, já aconteceu, a questão é que a quantidade e rapidez com que está a aumentar é muito superior”, exemplificou à Lusa.
Otimista em relação ao planeta, Fátima Abrantes já o é menos quanto
aos seres humanos. Diz que as alterações de clima que existem desde o
inicio da vida da Terra mostram que o sistema climático se altera “mas
que tudo se rearranja e que o planeta continua”, ainda que as condições possam “não ser muito favoráveis para os humanos”.
“Há alterações na biodiversidade, certamente organismos serão
extintos e outros aparecerão, mas nos não sei se teremos capacidade para
resistir”, avisa.
Há três a cinco milhões de anos também se registava grande quantidade
de dióxido de carbono (CO2) na atmosfera, e há 65 milhões as
concentrações ainda eram superiores, supostamente devido à libertação de
grandes quantidades de metano, um processo que pode agora estar a
repetir-se, disse a cientista.
Nos últimos mil anos, lembrou Fátima Abrantes, houve na Europa um aumento da temperatura no período medieval, ao que se seguiu um arrefecimento.
A diferença das temperaturas foi de cerca de um grau, o suficiente para
os vikings se expandirem e ocuparem a região da Europa do norte, no
período medieval, e quase desaparecessem no período frio por “não
conseguirem adaptar-se às novas condições”. Os inuítes (Canadá) no
entanto conseguiram adaptar-se.
Fátima Abrantes citou um estudo para dizer que os vikings tinham uma
sociedade mais complexa e que por isso não se adaptaram tão bem como os
inuítes, e conclui: “Acredito que quanto mais complexa a organização
mais difícil conseguir que a população, como um todo, aceite a
possibilidade de ter que alterar a forma de vida”.
A investigadora lembra a complexidade das sociedades atuais. E também que muitos políticos influentes são hoje céticos em relação às alterações climáticas.
É verdade que as alterações climáticas sempre existiram “só que os
ciclos no passado estavam associados às variações orbitais, que têm a
ver com a posição da Terra em relação ao Sol”. Eram ciclos muito longos e
o aumento de CO2 era mínimo em relação que acontece hoje, na alteração
provocada pela Homem, disse.
“O problema não é o efeito de estufa, é o seu aumento descontrolado”,
acrescentou Silvia Antunes, técnica superior do IPMA, que citou
estatísticas para dizer que os meses de novembro e de março têm sido
aqueles em que têm sido sentidas as diferenças de temperatura mais
significativas.
Pela rapidez das alterações, no seminário falou-se também da
necessidade de minimizar impactos, como fez a especialista Susana
Costas, a propósito da proteção da orla costeira algarvia face à subida
do nível da água do mar.
O seminário termina na tarde de hoje, com a discussão dos impactos económicos e adaptações às alterações climáticas.
Fonte: https://zap.aeiou.pt/temperatura-planeta-pode-estabilizar-310736
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